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Miopia, Astigmatismo e Hipermetropia: Um Estudo Analítico sobre as Condições Oculares mais Frequentes

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    Alexandre Netto
  • há 15 minutos
  • 7 min de leitura


Os erros refrativos representam as condições oculares mais prevalentes globalmente, afetando bilhões de pessoas.


Este artigo analisa as características clínicas, epidemiológicas e os mecanismos fisiopatológicos da miopia, hipermetropia e astigmatismo.


São discutidos dados atualizados sobre prevalência, fatores de risco, métodos diagnósticos e opções terapêuticas para cada condição.


Conclui-se que, apesar de sua alta prevalência, estas ametropias podem ser efetivamente gerenciadas com intervenções apropriadas, destacando-se a importância do diagnóstico precoce e acompanhamento oftalmológico regular.


1. Contextualização


Os erros refrativos constituem um grupo de condições oculares caracterizadas pela incapacidade do olho em focar adequadamente a luz na retina, resultando em visão turva.


Miopia (dificuldade para enxergar à distância), hipermetropia (dificuldade para enxergar de perto) e astigmatismo (distorção visual causada por irregularidades na córnea) representam as ametropias mais comuns, afetando aproximadamente 2,2 bilhões de pessoas mundialmente (OMS, 2023).


A compreensão detalhada desses erros refrativos é fundamental para o manejo clínico adequado e desenvolvimento de estratégias preventivas.


Este artigo visa analisar os aspectos epidemiológicos, fisiopatológicos e terapêuticos destas três condições oculares prevalentes, fornecendo uma visão abrangente baseada em evidências científicas atualizadas.


2. Fisiopatologia dos Erros Refrativos


2.1 Miopia


A miopia caracteriza-se pela formação da imagem antes da retina, resultando em visão turva para objetos distantes. Apresenta dois mecanismos principais:


- Miopia Axial: Ocorre quando o comprimento anteroposterior do globo ocular é excessivo (>24mm). Este é o tipo mais comum, representando cerca de 70% dos casos.


- Miopia Refrativa: Resulta de alterações no poder refrativo da córnea ou cristalino, tornando-os excessivamente convergentes.


A fisiopatologia da miopia envolve interações complexas entre fatores genéticos e ambientais que influenciam o crescimento axial do olho durante o desenvolvimento.


Estudos recentes têm demonstrado alterações na esclerótica, particularmente no colágeno tipo I e proteoglicanos, que aumentam a complacência escleral, permitindo elongação axial excessiva (Morgan et al., 2021).


2.2 Hipermetropia


Na hipermetropia, a imagem forma-se teoricamente após a retina, resultando em dificuldade para focar objetos próximos. Caracteriza-se por:


- Hipermetropia Axial: Comprimento anteroposterior do globo ocular reduzido (<24mm).


- Hipermetropia Refrativa: Poder dióptrico insuficiente do sistema óptico ocular.


Ao contrário da miopia, a hipermetropia frequentemente apresenta mecanismos compensatórios através da acomodação do cristalino em indivíduos jovens, o que pode mascarar o diagnóstico.


Com o envelhecimento e perda da capacidade acomodativa, os sintomas tendem a se manifestar ou intensificar.


2.3 Astigmatismo


O astigmatismo resulta de irregularidades na curvatura da córnea ou, menos frequentemente, do cristalino, fazendo com que a luz seja refratada desigualmente nos diferentes meridianos oculares. Pode ser classificado em:


- Astigmatismo Regular: A curvatura máxima e mínima estão em meridianos perpendiculares entre si.


- Astigmatismo Irregular: A curvatura varia em diferentes regiões da córnea, sem padrão definido, geralmente associado a condições como ceratocone.


Quanto à relação com outros erros refrativos, classifica-se em:


- Astigmatismo miópico (simples ou composto)


- Astigmatismo hipermetrópico (simples ou composto)


- Astigmatismo misto


3. Epidemiologia


Dados epidemiológicos recentes mostram variações significativas na prevalência dos erros refrativos entre diferentes populações e faixas etárias:



Erro Refrativo: Miopia


Prevalência Global Estimada: 30-50 % da população mundial


Variação Regional: 80-90% em países do Leste Asiático; 30-40% na Europa e EUA




Erro Refrativo: Hipermetropia


Prevalência Global: 25-30% da população mundial


Variação Regional: Maior prevalência em populações caucasianas




Erro Refrativo: Astigmatismo


Prevalência Global: 20-30% da população mundial


Variação Regional: Distribuição relativamente uniforme globalmente


Tendências Epidemiológicas


A prevalência da miopia tem aumentado significativamente nas últimas décadas, com projeções indicando que aproximadamente 50% da população mundial será miope até 2050 (Holden et al., 2022).


Este fenômeno, denominado "epidemia de miopia", é particularmente pronunciado no Leste Asiático, onde países como Singapura, China e Coreia do Sul apresentam taxas de miopia superiores a 80% em adultos jovens.


3.3 Fatores de Risco


3.3.1 Miopia


- Genéticos: História familiar positiva (risco 2-5 vezes maior)


- Ambientais:


- Tempo reduzido em atividades ao ar livre (<2h/dia)

- Trabalho prolongado em visão próxima

- Níveis educacionais elevados

- Exposição limitada à luz natural durante o desenvolvimento

- Urbanização


3.3.2 Hipermetropia



- Genéticos: Forte componente hereditário


- Desenvolvimento ocular: Associado ao comprimento axial reduzido do globo ocular


- Idade: Hipermetropia manifesta aumenta com o envelhecimento devido à redução da acomodação


3.3.3 Astigmatismo

- Genéticos: Padrões familiares observados em múltiplos estudos


- Ambientais:


- Pressão palpebral crônica

- Trauma ocular prévio

- Cirurgias oculares


4. Diagnóstico


4.1 Avaliação Clínica


O diagnóstico dos erros refrativos baseia-se em:


- Anamnese: Sintomas como visão turva, fadiga ocular, cefaleia e desconforto visual


- Acuidade visual: Medida com tabela de Snellen ou LogMAR


- Refração objetiva: Retinoscopia, autorrefração ou aberrometria


- Refração subjetiva: Refinamento da refração objetiva para determinar a correção óptica ideal


- Cicloplegia: Especialmente importante em crianças e adultos jovens para neutralizar a acomodação e revelar o erro refrativo latente


4.2 Tecnologias Diagnósticas Avançadas


Avanços tecnológicos têm proporcionado métodos mais precisos para avaliação dos erros refrativos:


- Topografia corneana: Mapeamento detalhado da curvatura corneana, essencial para diagnóstico de astigmatismos irregulares


- Biometria óptica: Medição precisa do comprimento axial, profundidade da câmara anterior e curvatura corneana


- Aberrometria de frente de onda: Identificação de aberrações ópticas de alta ordem, frequentemente presentes em astigmatismos irregulares


- Tomografia de coerência óptica (OCT): Avaliação estrutural detalhada, particularmente importante no acompanhamento de miopia patológica


4.3 Critérios Diagnósticos


Os erros refrativos são classificados segundo critérios dióptricos:


- Miopia:

- Leve: -0,25 a -3,00D

- Moderada: -3,25 a -6,00D

- Alta: > -6,00D


- Hipermetropia:

- Leve: +0,25 a +2,00D

- Moderada: +2,25 a +5,00D

- Alta: > +5,00D


- Astigmatismo:

- Leve: 0,25 a 1,00D

- Moderado: 1,25 a 3,00D

- Alto: > 3,00D


5. Abordagens Terapêuticas


5.1 Correção Óptica


5.1.1 Óculos

Representam a opção mais segura e acessível para correção de erros refrativos. Avanços recentes incluem:


- Lentes digitais com filtros para luz azul


- Lentes progressivas de alta definição


- Lentes com tecnologia free-form para astigmatismos complexos


- Lentes específicas para controle de miopia em crianças


5.1.2 Lentes de Contato


Oferecem vantagens estéticas e funcionais, com opções expandidas:


- Lentes gelatinosas esféricas, tóricas e multifocais


- Lentes rígidas gás-permeáveis para astigmatismos irregulares


- Lentes esclerais para casos complexos


- Lentes de ortoceratologia para controle de miopia


5.2 Intervenções Cirúrgicas


5.2.1 Cirurgias Refrativas Corneanas


- LASIK (Laser-Assisted In Situ Keratomileusis): Procedimento mais comum para miopia (-12,00D), hipermetropia (+6,00D) e astigmatismo (<6,00D)


- PRK (Ceratectomia Fotorrefrativa): Alternativa para córneas finas


- SMILE (Small Incision Lenticule Extraction): Técnica minimamente invasiva para miopia e astigmatismo miópico


5.2.2 Procedimentos Intraoculares


- Implante de Lentes Fáquicas: Opção para altos erros refrativos em pacientes jovens


- Extração do Cristalino Transparente com Implante de LIO: Para pacientes pré-presbiópicos com altos erros refrativos


5.3 Controle de Progressão da Miopia


Intervenções baseadas em evidências para retardar a progressão miópica em crianças:


- Farmacológicas:


- Atropina em baixa concentração (0,01% a 0,05%)

- Pirenzepina tópica

- Ópticas:


- Lentes multifocais e bifocais

- Lentes de contato com desenho periférico específico

- Ortoceratologia


- Comportamentais:

- Aumento do tempo em atividades ao ar livre (2 horas/dia)

- Redução de atividades em visão próxima prolongada

- Manutenção de distância adequada para leitura e uso de dispositivos eletrônicos


6. Consequências e Complicações


6.1 Miopia


A miopia, especialmente em graus elevados (>6,00D), associa-se a maior risco de:


- Degeneração macular miópica: Principal causa de perda visual irreversível associada à miopia alta


- Descolamento de retina: Risco aumentado em 3-10 vezes


- Glaucoma: Risco aumentado em 2-3 vezes


- Catarata precoce: Desenvolvimento mais frequente e em idade mais jovem


- Estrias lacquer: Rupturas na membrana de Bruch visualizadas como estrias amareladas


6.2 Hipermetropia


A hipermetropia não corrigida pode resultar em:


- Ambliopia: Particularmente em crianças com hipermetropia unilateral ou assimétrica


- Estrabismo convergente: Especialmente em crianças com hipermetropia moderada a alta


- Fadiga visual (astenopia): Manifestada como cefaleia, ardência ocular e visão intermitentemente turva


- Desenvolvimento precoce de presbiopia: Sintomas de dificuldade para leitura em idade jovem


6.3 Astigmatismo


O astigmatismo não corrigido associa-se a:


- Ambliopia meridional: Desenvolvimento de déficit visual no meridiano com maior erro refrativo


- Distorção visual persistente: Mesmo após correção tardia


- Adaptação neural anormal: Pode comprometer o desenvolvimento visual adequado


7. Considerações Especiais em Populações Específicas


7.1 Crianças


- Importância do diagnóstico precoce para prevenção de ambliopia


- Recomendação de exame oftalmológico antes dos 3-4 anos


- Necessidade de cicloplegia para refração precisa


- Monitoramento da progressão da miopia


- Correção total da hipermetropia em casos de estrabismo


7.2 Idosos


- Mudanças refrativas associadas ao envelhecimento (shift hipermetrópico pelo núcleo cristaliniano)


- Maior susceptibilidade a complicações de miopia alta


- Associação com outras condições oculares (catarata, glaucoma, DMRI)


- Importância da avaliação da qualidade de vida relacionada à visão


7.3 Pacientes com Comorbidades


- Associação de erros refrativos com diabetes (flutuações refrativas)


- Considerações especiais em pacientes com doenças autoimunes


- Impacto de medicações sistêmicas no erro refrativo


8. Perspectivas Futuras e Desafios


8.1 Avanços Tecnológicos


- Lentes intraoculares com desenhos avançados para erros refrativos complexos


- Novos biomateriais para lentes de contato


- Algoritmos personalizados para cirurgias refrativas guiadas por topografia e aberrometria


- Tecnologias de realidade aumentada para auxiliar deficientes visuais


8.2 Desafios em Saúde Pública


- Acesso limitado a serviços oftalmológicos em países em desenvolvimento


- Subdiagnóstico de erros refrativos em populações vulneráveis


- Custo-efetividade de programas de rastreamento visual


- Implementação de estratégias para controle da epidemia de miopia


8.3 Linhas de Pesquisa Promissoras


- Fatores epigenéticos na progressão da miopia


- Terapias farmacológicas para remodelamento corneano


- Intervenções baseadas em optogenética para ametropias elevadas


- Biomarcadores preditivos da progressão miópica


9. Conclusão


A miopia, hipermetropia e astigmatismo representam as condições oculares mais prevalentes globalmente, com impacto significativo na qualidade de vida, produtividade e desenvolvimento visual.


Evidências científicas recentes têm expandido nossa compreensão sobre a fisiopatologia destas condições, permitindo abordagens preventivas e terapêuticas mais efetivas.


O diagnóstico precoce, associado a intervenções apropriadas, permanece como o pilar fundamental para o manejo adequado dos erros refrativos.

Considerando o aumento global na prevalência da miopia e seu potencial para complicações oculares graves, estratégias preventivas assumem importância crescente na prática oftalmológica contemporânea.


Apesar dos avanços significativos nas opções terapêuticas, desafios importantes persistem, particularmente relacionados ao acesso equitativo aos cuidados oftalmológicos e implementação de programas de saúde ocular em escala populacional.


A abordagem interdisciplinar, integrando aspectos clínicos, epidemiológicos e de saúde pública, representa o caminho mais promissor para enfrentar a crescente carga global dos erros refrativos.


Referências


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